Se por um lado, a população busca cada vez mais o auxílio de nutrólogos, por outro, profissionais da saúde AINDA possuem uma visão preconceituosa da especialidade.
Mas por que isso acontece? Muitas vezes julgamos por puro pré-conceito, mas no caso da Nutrologia existem algumas explicações bem plausíveis e que justificam esse pré-conceito.
Fiz a minha pós em 2014 na ABRAN e naquela época a Nutrologia ainda não tinha estourado, como a especialidade “da moda”.
De lá pra cá, a especialidade cresceu muito. O número de vagas de residência quase dobrou, sinal de que mais médicos buscam a especialidade. Mas afinal, quais seriam essas explicações para a má fama dos nutrólogos perante os demais colegas?
Sempre falo para colegas que na Nutrologia temos 4 grandes problemas.
Primeiro problema: escassez de vagas de residência, mesmo sendo uma especialidade desde 1978 e tendo surgido na América latina antes mesmo da Nutrição, pelas mãos do médico argentino Pedro Escudero.
Se há escassez de vagas, quem deseja se especializar e não consegue ou não quer fazer a residência, acaba recorrendo às pós-graduações (aula 1 vez por mês aos finais de semana).
Com isso a formação sai bastante deficitária, já que fazer uma pós-graduação lato sensu não se compara à formação dada por uma residência. Experiência própria de quem fez pós, mas convive diariamente com quem fez residência.
Dá para se formar bons profissionais com pós-graduação? Sim, mas é bem mais difícil. Dependerá de inúmeros fatores, dentre eles a vivência da especialidade, disciplina e empenho do médico.
Pois, quando se está em serviços grandes (leia-se SUS), recebemos uma variedade grande de patologias. Quando o médico se restringe ao consultório, essa variedade reduz substancialmente. Na residência se aprende pela repetição diária. Isso sedimenta o conhecimento e forma melhores profissionais.
Segundo problema: quantidade exorbitante de médicos que atuam sem serem especialistas.
No Brasil se uma pessoa deseja atuar em uma especialidade, ela como médica pode atuar. Não existe impedimento legal, ou seja, mesmo sem a formação padrão-ouro (leia residência) ela pode atuar.
Porém, se der algum tipo de problema na justiça, o juiz e o médico perito (caso ela não seja titulada ou tenha feito a residência) reconhecerão que o ela foi imperita.
imperito
adjetivo substantivo masculino1. que ou aquele que não sabe; ignorante.”(aluno) i. em questões gramaticais”2. que ou aquele que é inábil ou imperfeito na sua profissão ou arte.
Nesse contexto, segundo o Conselho Federal de Medicina (CFM) em seu site, somos pouco mais de 1200 Nutrólogos ativos no Brasil.
A conta não bate !
Em um passeio por redes sociais, encontramos 01 nutrólogo a cada metro quadrado da web, exageros à parte… seriam “nutrólogos” mesmo? Não. A grande maioria que se diz, na verdade não é. São o que denominamos de “nutrólogos sem RQE”, ou seja, não são Nutrólogos.
E eles sabem que não podem propagar que fizeram pós-graduação, pois isso configura infração ética.
E eles também sabem que não podem induzir o paciente a pensar que são especialistas.
Mas na realidade é que a grande faz isso, mesmo sabendo que não é o correto.
Resultado: o segundo problema! Uma grande quantidade de profissionais que atuam, se dizem “Nutrólogos” e não são.
Então te faço uma pergunta: Isso é ou não é um prato cheio para a Nutrologia ser malvista? Entende que as vezes o preconceito é justificável?
Poucas áreas na medicina tem tantos profissionais sem registro de qualificação de especialista (RQE) como a Nutrologia, Endocrinologia, Dermatologia.
Terceiro problema: acréscimo de práticas não respaldadas pela ABRAN.
Condutas dentro da Nutrologia podem ser controversas. O que mais há no mundo das ciências nutricionais são controvérsias e incertezas.
Há quem defenda utilização de hormônios para fins estéticos, implantes hormonais, soros endovenosos desnecessariamente, nutrientes injetáveis mesmo com trato digestivo funcionante.
Quando falo Nutrologia, englobo somente aqueles que possuem RQE. A Nutrologia clássica, defendida pela ABRAN não tem dentro do seu roll de procedimentos esse tipo de prática, conforme consta no próprio site da ABRAN.
Essas práticas não possuem respaldo da ABRAN. Ou seja, podemos considerá-las práticas paralelas à Nutrologia. Muitas delas também não possuem a chancela do Conselho Federal de Medicina.
E como eu disse, estão sendo praticadas por médicos Nutrólogos, ou seja, médicos com RQE de Nutrologia.
Isso, aos olhos das outras especialidades, esses Nutrólogos também são malvistos. Esta aí o terceiro problema e que justifica o preconceito.
Quarto problema: a grande má fama que os demais médicos possuem da Nutrologia.
Quando decidi realizar o curso básico de Nutrologia para acadêmicos de medicina, preparei um questionário pré-inscrição e nele acrescentei uma série de perguntas. Dentre elas a seguinte afirmação:
Qual a visão que os médicos que você convive (professores, amigos, colegas) possuem dos Nutrólogos?
Opção 1: Meus professores e colegas médicos possuem uma boa visão acerca da Nutrologia. Ou seja, visão positiva.
Opção 2: Meus professores e colegas médicos possuem uma visão preconceituosa sobre a Nutrologia. Acreditam ser uma área envolta em charlatanismo e com práticas não baseadas em evidência. Ou seja, visão negativa.
Opção 3: Ainda não sei qual a visão meus professores e colegas possuem da Nutrologia.
Opção 4: Outro.
Obviamente, não preciso dizer que a maioria dos alunos (mais de 130) responderam a opção 2. Ou seja, aqui o quarto problema nos revela outras questões.
Esse preconceito existe em decorrência do desconhecimento do que é a real Nutrologia?
Afinal, pouquíssimos médicos tiveram contato com a Nutrologia durante a graduação. Sequer sabem fazer orientações nutricionais básicas.
Esse preconceito decorre de experiências ruins que esses profissionais tiveram com “nutrólogos”, ou até mesmo com Nutrólogos com RQE?
Esse preconceito advém das condutas controversas citadas acima?
Esse preconceito existe fruto da ignorância de alguns médicos em sequer saberem o real papel do nutrólogo e muitas vezes confundirem com a atuação do nutrólogo com a do nutricionista?
É triste falar, mas Nutrólogos são nutricionistas de luxo, na visão de alguns profissionais ignorantes.
Para vários médicos, o Nutrólogo é o profissional que fez uma pós de fim de medicina, não achou o seu lugar na medicina, resolveu atirar para todos os lados.
É o profissional que ostenta em redes sociais. É aquele que propaga fake news e práticas com baixo nível de evidência. É o médico que lucra em uma tarde o que os demais levam uma semana para ganhar.
É essa infeliz visão que percebo na prática e se confirma no questionário aplicado.
Os problemas foram gerados, mas há soluções? Sim, porém, demanda tempo e consiste em um trabalho árduo, que poucos querem pagar o preço.
Eu e nem meus colegas do movimento Nutrologia Brasil, por mais que façamos postagens esclarecedoras sobre o que é a Nutrologia, dificilmente convenceremos os atuantes na Nutrologia a agirem dentro do que acreditamos ser a real Nutrologia (defendida pela ABRAN).
Porém, se agirmos na base, nos acadêmicos de medicina, podemos mostrar, ensinar e direcioná-los para um caminho que acreditamos ser o correto.
Como consequência disso, levaremos à graduação de medicina grandiosidade da nossa especialidade e a real forma de atuação da Nutrologia.
Esse é o objetivo do nosso curso, mostrar para o acadêmico de medicina:
Quando a Nutrologia surgiu
O que faz um Nutrólogo
A infinidade de áreas ele pode atuar
A diferença entre o nutrólogo e o nutricionista, bem como a importância de um na atuação do outro.
A diferença entre o nutrólogo e o endocrinologista, o que é competência de cada um.
O que faz parte do roll de procedimentos nutrológicos.
O que segundo a ABRAN não faz parte da real Nutrologia.
O que segundo o CFM é vetado ao médico praticar. Que Nutrologia não é sinônimo de tratamentos caros e sequer precisa incluir medicações manipuladas.
Quais as indicações para utilizar a via parenteral.
Como a nutroterapia pode agir na prevenção e tratamento de diversas doenças.
Que dá para ser um profissional de sucesso, praticando uma Nutrologia séria, ética, baseada em evidências.
Temos muito chão pela frente. Como diz uma grande professora de Nutrologia (Dra. Sandra Lúcia Fernandes): “não desanimemos diante das adversidades, mostremos o nosso real valor, lutemos pela especialidade, conquistemos nosso espaço”.
Sigamos avante em nossa missão.
Autor: Dr. Frederico Lobo – Médico Nutrólogo – CRM-GO 13192 – RQE 11915